O futuro da mobilidade urbana: como a micromobilidade está a revolucionar o transporte nas cidades – Parte I
Atualmente, é notório que as áreas urbanas concentram a maior parte da população mundial. Tal facto não é surpreendente, considerando-se as oportunidades e facilidade oferecidas pelas cidades. Estimativas das Nações Unidas apontam que até 2050 cerca de 70% da população mundial irá residir em centros urbanos. Desta forma, alerta-se cada vez mais para problemáticas relacionadas com as emissões de gases de efeitos de estufa (GEE) e com o congestionamento das cidades, trazendo novos desafios para a sustentabilidade da mobilidade urbana.
A forma como, normalmente, nos deslocamos nas cidades (um veículo, um passageiro) é uma das grandes causas das emissões de dióxido de carbono (CO2). Dados divulgados pela Agência Europeia do Ambiente mostram que, só na Europa, os transportes são responsáveis por 30% das emissões de CO2, sendo que 72% dessas emissões provêm de transportes rodoviários. A isto acrescem os crescentes congestionamentos de trânsito e a poluição daí decorrente. O futuro da mobilidade urbana passa, inevitavelmente, por meios de transporte e infraestruturas mais verdes, limpas, acessíveis e sustentáveis.
Micromobilidade
Como foi referido, a mobilidade urbana encontra-se em grande mudança, desencadeada por melhorias sociais e tecnológicas, sendo os modos de transporte ativos ou modos suaves, como a micromobilidade, uma oportunidade para resolver as problemáticas associadas.
A micromobilidade é um conceito cada vez mais presente no cenário urbano. Trata-se de um modo de transporte leve e ágil de veículos de velocidade reduzida, até 25 km/h, ou moderada, até 45km/h, com o intuito de percorrer distâncias curtas, normalmente para “a primeira ou última milha” de um trajeto. Esta tendência é sustentável do ponto de vista ambiental, económico e social, pois os veículos, como as trotinetes ou bicicletas, movidos com energia gerada pelos seus utilizadores ou a energia elétrica, minimizam as emissões de GEE associadas a deslocações.
Segundo um estudo apresentado pelo McKinsey Center for Future Mobility, cerca de 60% das viagens realizadas em todo o mundo são para percursos inferiores a 8 km. Desta forma, a micromobilidade apresenta-se como uma opção eficiente e sustentável para muitas pessoas, enquanto contribui para a redução do tráfego e da poluição nas cidades.
Micromobilidade partilhada
A micromobilidade partilhada é uma opção cada vez mais popular em muitas cidades por todo o mundo, devido à sua praticidade, acessibilidade e sustentabilidade, tendo vindo a estabelecer-se, cada vez mais, como uma alternativa flexível e eficiente aos meios tradicionais de transporte, como carros e transporte público. Uma das maiores vantagens para quem utiliza prende-se com a facilidade de uso, podendo os utilizadores usufruir sem necessidade de investir num veículo próprio.
Um dos exemplos mais comuns d é o serviço de partilha de bicicletas, facultado em diversas cidades ao redor do mundo por empresas como a Lime, Jump, Mobike e Ofo. Igualmente, a partilha de trotinetes elétricas, através de empresas como a Bird e a Lime, tem crescido em popularidade em muitas cidades, permitindo que os usuários percorram distâncias curtas com rapidez e praticidade.
A micromobilidade partilhada pode ser uma solução eficiente para os desafios de mobilidade urbana enfrentados nas cidades. No entanto, é importante que as empresas, as autoridades e os usuários trabalhem juntos para garantir a mesma é segura, acessível e conveniente para todos os que usufruem das cidades.
Vantagens e Desafios
As vantagens são obvias e já amplamente as referimos: rapidez, flexibilidade, eficiência, menores emissões de GEE… No entanto, apesar destas, a micromobilidade enfrenta alguns desafios importantes.
As infraestruturas das cidades como um obstáculo.
Muitas cidades ainda não estão, ainda, preparadas para receber estes novos modos de transporte, o que acaba por prejudicar a sua segurança e eficiência. A falta de ciclovias adequadas para a circulação de bicicletas e trotinetes, por exemplo, pode tornar as deslocações perigosas e desconfortáveis, aumentando o risco de acidentes, quer para os próprios utilizadores, quer para os peões que circulam nos passeios.
A falta de regulamentação.
O Código da Estrada (Lei n.º 72/2013, de 3 de setembro) tem vindo a sofrer alterações que promovem o uso de bicicletas, atribuindo-lhes direitos e deveres que contribuam para uma “coexistência pacifica entre estes e os demais utilizadores da via pública”. Destaca-se o seguinte:
- Os ciclistas (velocípedes) devem ser portadores de documento legal de identificação pessoal.
- Os ciclistas podem circular nas bermas, desde que não coloquem em perigo ou perturbem os peões que nelas circulem.
- Os velocípedes são equiparados a automóveis ou motociclos no que diz respeito à regra da prioridade (regra geral de cedência de passagem). Ou seja, não existindo sinalização, quando um ciclista se apresenta pela direita tem prioridade sobre os restantes veículos.
- Os ciclistas não estão obrigados a circular nas pistas que lhes são destinadas, podendo fazê-lo juntamente com o restante trânsito, se se considerar que esta é uma alternativa mais vantajosa.
- Nas rotundas, os ciclistas podem ocupar a via de trânsito mais à direita, ainda que não pretendam sair na primeira via de saída. No entanto, têm o dever de conceder a saída aos condutores que pretendam sair da rotunda.
- Desde o anoitecer ao amanhecer, ou sempre que as condições meteorológicas ou ambientais tornem a visibilidade insuficiente, os velocípedes devem circular com utilização dos dispositivos de iluminação e refletores.
Embora muitas cidades já tenham leis e normas que regulam o uso da micromobilidade e, como vimos, o próprio código da estrada português estabelece regras relevantes, ainda há uma grande falta de fiscalização e condenação para quem não cumpre estas regras.
Com não menos relevância refere-se o facto de a utilização de capacete não ser obrigatória. No entanto, uma vez que tal aumenta o risco de acidente grave, algumas associações nacionais têm vindo a incentivar alterações legislativas nesse sentido.
A segurança de todos.
Em países como Portugal, por oposição a países como, por exemplo, os Países Baixos, a utilização de bicicletas e trotinetes ainda é pouco compreendida pela população em geral. Por um lado, os veículos automóveis não têm o respeito necessário pela segurança de velocípedes, não respeitando as distâncias e aumentando o risco de acidente, e, por outro lado, muitos velocípedes, quer por receio de circular na faixa de rodagem, quer por desconhecimento, acabam por circular de forma inadequada, circulando, por exemplo, nos passeios, colocando em risco a sua integridade física e a de outros e aumentando o risco de acidente também para os peões.
O principal desafio para uma micromobilidade segura passará, então, pela responsabilidade política com medidas urgentes de promoção de segurança rodoviária, pela sensibilização de todos para estas matérias, assim mais e melhor fiscalização de comportamentos de risco por parte dos automobilistas em relação a utilizadores vulneráveis, mas também velocípedes em relação a peões.
Na próxima semana traremos casos concretos e abordaremos o futuro da micromobilidade!
Fontes:
Caetano, Luís (2020). A Mobilidade e as Cidades Circulares. URL: https://www.w2g.pt/2020/09/a-mobilidade-e-as-cidades-circulares-1023/ [Acedido em abril de 2023]
Caetano, Luís (2022). O que é a Micromobilidade. URL: https://www.w2g.pt/2020/09/a-mobilidade-e-as-cidades-circulares-1023/ [Acedido em abril de 2023]
EDP (n.d). Mobilidade urbana. 5 tendências sustentáveis das cidades inteligentes. URL: https://www.edp.com/pt-pt/mobilidade-urbana-5-tendencias-sustentaveis-das-cidades-inteligentes [Acedido em abril de 2023]
Engenho e Arte (2020). Mobilidade, a revolução no transporte já chegou. URL: https://www.engenhoearte.info/post/a-revolu%C3%A7%C3%A3o-da-micromobilidade [Acedido em abril de 2023]
Ferrão, A. F. T. (2020). O papel da micro-mobilidade nos transportes urbanos do futuro (Doctoral dissertation, Universidade de Coimbra).
ITDP (2021). Micromobilidade: o momento atual precisa de integração. URL: https://itdpbrasil.org/micromobilidade-o-momento-atual-precisa-de-integracao/ [Acedido em abril de 2023]
On the Go (2021). Micromobilidade: o que é e quais veículos fazem parte. URL: https://scootereletricagoiania.com.br/sem-categoria/micromobilidade-o-que-e-e-quais-veiculos-fazem-parte/ [Acedido em abril de 2023]