Turismo, pandemia e sustentabilidade: recuar ou avançar?
O turismo tem sido, sobretudo nos anos mais recentes, um dos principais motores da economia nacional. Os resultados divulgados pelo FMI, em abril de 2020, revelavam um ligeiro abrandamento no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na globalidade das economias em 2019 (+2,9%, após +3,6% em 2018) seguindo a tendência do ano precedente. Esta desaceleração no crescimento registou-se tanto nas economias mais desenvolvidas, como nas economias emergentes e em desenvolvimento. Em 2019, o PIB português aumentou 2,2% em volume (+2,6% em 2018) e 3,9% em termos nominais (+4,3% em 2018) tendo atingido 212,3 mil milhões de euros, com as receitas turísticas a registaram um contributo de 8,7% para o PIB nacional.
Dados estatísticos do ano de 2019 apontavam para a existência de:
- Mais de 7000 alojamentos turísticos coletivos;
- Um total de 27 895 078 entradas de turistas (residentes e não residentes) nos alojamentos;
- Total de 671 644 camas, mais 362 247 em estabelecimentos hoteleiros e similares;
- 73 milhares de pessoas trabalhavam em alojamentos turísticos coletivos, embora quase 40% tivessem contrato temporário.
É certo que o ano de 2020 terá mudado, senão para sempre pelo menos durante muito tempo, a forma como viajamos. A saúde pública e a segurança sanitária passaram a estar na ordem do dia e o comportamento e escolhas dos turistas são afetados tanto por fatores psicológicos, relacionados com a possibilidade de contaminação que se manterá presente pelo menos até haver uma vacina e que, inevitavelmente, tem impacte na vontade de viajar e nas condições exigidas aos destinos, como por fatores económicos, tendo este fator assumido um novo peso, devido à diminuição do rendimento familiar, como resultado de situações de layoff ou desemprego.
Em toda a Europa, estima-se que, só no sector do turismo, entre 6,6 e 11,7 milhões de empregos possam estar em risco de redução do horário de trabalho (e consequente redução das compensações) ou perda de empregos permanentes, que representam entre 3,2% e 5,6% da população ativa na UE.
Em julho, a estimativa aponta para cerca de 1,0 milhões de hóspedes e de 2,6 milhões de dormidas no total do alojamento turístico, situação que reflete decréscimos de 64% e 68,0%, respetivamente, para cada um dos indicadores, face a julho de 2019. Em relação ao indicador “dormidas”, a previsão indiciava uma quebra inferior por parte dos residentes (-31,3%) face aos não residentes (-84,2%).
Os dados são claros: o impacte está longe de ser apenas económico. O aumento do desemprego e o regresso ao passado no que ao uso de descartáveis diz respeito são só mais dois exemplos das consequências a ter em conta. Cada país e região tem sido afetado de maneira diferente pela pandemia, no entanto, a alteração das preferências e exigências dos consumidores oferece (mais) uma oportunidade para a promoção de alterações no setor, que se quer mais diversificado e sustentável, sem perder o foco dos objetivos anteriormente definidos, que visam a integração da sustentabilidade como parte fundamental das políticas de turismo.
A Estratégia Turismo 2027, enquanto referencial estratégico do turismo no nosso país, tem explicitamente a sustentabilidade como princípio orientador e define objetivos e metas ambiciosas a atingir nas três dimensões da sustentabilidade. Deve, então, a Covid-19 ser “usada como desculpa” para abrandar a aposta na sustentabilidade? Ou deve, por outro lado, ser a sustentabilidade assumida como o caminho para a recuperação do sector?