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    Valoração Económica dos Serviços do Ecossistema – Parte II

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    Valoração Económica dos Serviços do Ecossistema – Parte II

    Nas últimas semanas temos refletido sobre a noção de serviços do ecossistema e podemos considerar que a compreensão das características económicas dos seus bens e valores nos permitirão gerir, manter, restaurar e avaliar melhor os serviços da natureza. Hoje, falamos um pouco de economia do ambiente associada aos serviços dos ecossistemas.

    Características dos Bens e Valores Derivados dos Serviços do Ecossistema

    Segundo os economistas, os bens mais comummente transacionados têm duas características que os tornam apropriados para o mercado: rivalidade e exclusividade.

    Existe um espetro de rival para não-rival e de exclusivo para não-exclusivo. No Quadro 1 são apresentadas as combinações das características que definem a dimensão de bem público e de bem privado dos serviços dos ecossistemas e o tipo de situações possíveis relativamente à sua apropriação pelos proprietários da terra.

    Quadro 1 – Características de bem público, bem privado, rival e não-rival do serviço. Fonte: Adaptado de Madureira et al., 2013, p.49 e 50)

    Características do Serviço Rival (O bem-estar de um beneficiário é afetado pelo consumo do serviço por outra ou outras pessoas) Não rival (O bem-estar de um beneficiário não é afetado pelo consumo do serviço por outras pessoas)
    Exclusivo (O acesso ao serviço é limitado por mecanismos de acesso como o preço ou a detenção de uma licença de uso) Bens Privados (Bens que podem ser divididos e proporcionados de forma separada aos diferentes indivíduos sem benefícios nem custos externos para os outros) Bens de Clube (O acesso ao serviço é limitado, mas o bem-estar de um beneficiário não é afetado pelo consumo de outras pessoas. Estes bens funcionam de forma semelhante a um clube)
    Não-exclusivo (O serviço uma vez disponibilizado fica disponível para todos os seus potenciais beneficiários) Bens Comuns ou Common Pool Resource (CPR) (Têm caráter não-exclusivo que leva a que um serviço depois de disponibilizado uma vez, fica disponível para todos os seus potenciais beneficiários. No entanto, o bem-estar de um beneficiário é afetado pelo consumo do serviço por outras pessoas, o que confere a estes bens serem rivais) Bens Públicos (Estes são compreendidos como um bem ou serviço cujo consumo ou provisão não pode ser privada a um indivíduo ou grupo de indivíduos e o bem-estar de um consumidor não é afetado pelo facto de outro ou outros consumidores consumirem o mesmo serviço)

    Valorização e Valoração dos Serviços do Ecossistema

    A valoração económica é o que permite medir o valor da prestação destes serviços na ótica dos respetivos beneficiários. Conforme já definido e segundo Madureira (2013), “o valor económico é uma medida do bem-estar que as pessoas obtêm com o consumo de um bem ou serviço e varia com a quantidade consumida desse bem ou serviço”. Oliveira (2014), acrescenta ainda que o bem-estar não depende apenas de bens e serviços transacionados no mercado, mas, também, da quantidade e/ou qualidade de bens e serviços sem mercado, como a maioria dos bens públicos.

    Conforme descrito no Quadro 1, o valor económico é medido com base na disposição a pagar (DaP) ou disposição de aceitação de compensação (DaR), por parte de um indivíduo, por uma variação positiva (ou aceitação de uma variação negativa) na quantidade/qualidade de um bem ou serviço.

    Quadro 2 – Medida dos benefícios/danos aplicadas a variações no nível de provisão de serviços de ecossistema– DaP e DaR. Fonte: Chaves (2017) e Field (1994)

    Disposição a pagar (DaP): reflete o montante máximo que o indivíduo estaria disposto a pagar para obter um acréscimo na provisão de um serviço ou para evitar a deterioração de um recurso ambiental. Por outras palavras, reflete a capacidade para pagar (“ability to pay”) para obter um benefício e/ou evitar um dano.
    Disposição a receber (DaR): reflete o montante mínimo que o indivíduo estaria disposto a receber, de modo a ser compensado pela aceitação de um decréscimo da provisão ou pela deterioração de um recurso ambiental. Ou seja, para tolerar um dano e/ou renunciar a um benefício.

     

    Quando estas variações são unitárias obtém-se o DaP ou DaR marginal e, quando associadas a uma certa quantidade, obtém-se o DaR ou DaP total. O valor marginal é um valor “adicional” ou “extra”, incorrido pelo consumo de uma unidade adicional de um bem ou serviço (Samuelson, 2010).

    O valor económico (VE) varia conforme a quantidade consumida, sendo que as primeiras unidades valem mais do que as últimas. A diferença entre o preço e o valor económico é expresso pelo conceito de excedente do consumidor, que é a diferença entre o montante monetário máximo que o consumidor estaria disposto a pagar e o preço do mercado, de modo a obter uma certa quantidade de um bem ou serviço (Madureira, 2013). É importante reforçar a ideia de que o valor económico de um serviço varia conforme o indivíduo, correspondendo à medida da quantidade máxima de outros bens que o mesmo está disposto a abdicar, para beneficiar de determinado serviço. Seguindo esta linha de pensamento e tendo em consideração os diferentes níveis de consciência ambiental individual, o preço não mede o valor dos SE. São as suas variações no preço que permitem estimar os ganhos e as perdas de bem-estar resultantes do aumento ou da diminuição do preço de determinado bem ou serviço (Oliveira, 2014).

    Na situação em que o serviço se transaciona nos mercados (serviços de aprovisionamento, como por ex.: alimentos e matérias-primas), o preço do mercado – indicador do valor económico – corresponde à DaP marginal dos indivíduos pela última unidade consumida do serviço (Madureira, 2013). No caso da utilização de métodos de mercado, quando existem, estes são, por vezes, distorcidos quando, por exemplo, estes não são totalmente competitivos – levando a que os preços não reflitam corretamente os preços marginais (Chaves, 2017).

    Na ausência de mercados (por ex.: serviços de regulação e culturais), o valor económico dos SE pode ser obtido recorrendo a um conjunto de métodos e técnicas designados por métodos de valoração de bens sem mercado, que medem variações no bem-estar das pessoas com base nas preferências destas (Madureira, 2013).

    Estes métodos e técnicas dividem-se em duas categorias: métodos de preferências reveladas (revealed preference methods) e métodos de preferências declaradas (stated preference methods) e encontram-se descritos no Quadro 3.

    Quadro 3 – Síntese do métodos de valoração económica dos bens sem mercado. Fonte: elaboração própria a partir de Chaves (2017) e Madureira (2013)

    Abordagem de valoração

    Método de valoração

    Descrição

    Método de Preferências Reveladas

    Método do Custo de viagem (Travel cos method)

    Estima a procura de locais de recreio e lazer utilizando o custo da viagem como proxy[1] para o preço da visita ao local (por ex.: o valor de um dia de visita a uma zona húmida para um dado visitante e/ou valor do recreio nesse local, considerando todos os visitantes num certo período de tempo).

    Modelo de Utilidade Aleatória

    (Random utility models)

    Estima o valor de variações na qualidade de locais de recreio (permite obter, em simultâneo, o valor do acesso aos vários locais) e o padrão de substituição entre esses locais. É solicitado à pessoa (p.ex. caçador) para escolher o local de recreio que visitou dentre um conjunto de locais de recreio substitutos, durante um certo período de tempo.

    Método do Preço hedónico (Hedonic price method)

    Estima o preço implícito de um atributo ambiental através de escolhas individuais de bens com mercado que contêm esse atributo (p.ex.: o preço implícito da gestão florestal sustentável no preço de um móvel de madeira com certificação florestal).

    Comportamento defensivo (Averting behaviour)

    Estima o valor de um bem ou serviço ambiental observando os custos individuais suportados para evitar a sua perda (p.ex.: a compra de água engarrafada para garantir a segurança de beber água potável).

    Método de Preferências Declaradas

    Valoração contingente (Contingent valuation)

    Construção de mercados hipotéticos através de um inquérito em que os indivíduos exprimem a DaP por uma variação no nível de provisão de um serviço (p.ex.: DaP para evitar ruído).

    Experiências de escolha (Choice Modelling)

    Construção de mercados hipotéticos através de um inquérito em que os indivíduos podem escolher a sua opção preferida de entre um conjunto de duas ou mais opções de escolha, definidas por um conjunto de atributos onde o preço está incluído (p.ex.: escolher entre três alternativas definidas por níveis diferentes de oferta de serviços de recreio, prevenção de incêndio e qualidade da paisagem cultural).

    [1] Proxy – variável utilizada na modelação de dados que se assemelham a dados associados a uma outra variável, tipicamente mais difícil de pesquisar.

     

    A opção entre estas duas abordagens baseia-se nos seguintes fatores:

    • Capacidade que o método tem, ou não, em capturar todas as componentes de valor, isto é, a sua capacidade de medir componentes não ligadas ao uso direto ou indireto do serviço;
    • Possibilidade de obter informação sobre os benefícios ou custos económicos previamente à tomada de decisão, o que explica a utilização generalizada dos métodos de preferências declaradas, apesar deste apresentar maior complexidade e custo de aplicação.

    Madureira (2013)

     

    Os métodos de valoração sem mercado permitem capturar as diferentes componentes que tornam possível o cálculo do “Valor Económico Total” (VET). Segundo o TEEB (2010), este é reconhecido como o somatório de “valores de uso” e os “valores de não uso”. Estas componentes encontram-se sintetizadas no Quadro 4.

    VET = Valores de Uso (VU) + Valores de Não-Uso (VNU)

    Conforme já referido, poucos são os serviços de ecossistema com preços de mercado. Aqueles que, tendencialmente, são precificados são os VU – valores de consumo e serviços de aprovisionamento – que apresentam uso direto (p.ex: culturas agrícolas, pecuária, água), portanto que são consumidos diretamente pelos indivíduos, no presente ou no futuro. Os VNU – como é o caso da recreação – costumam ter influência na tomada de decisão sendo, no entanto, raramente contabilizados em termos monetários. Outros benefícios dos ecossistemas, especialmente serviços de regulação denominados de valores de uso indireto, tendem a ser incluídos no cálculo do VET. Contudo, permanecem invisíveis nas contas do dia-a-dia da sociedade (TEEB, 2010).

    Os VNU estão relacionados com o seu valor intrínseco, no qual a simples existência proporciona valor, independentemente da sua utilização, no presente ou no futuro.

    Quadro 4– Componentes de valor constituintes do conceito de valor económico total (VET). Fonte: elaboração própria a partir de Madureira (2013) e Oliveira (2014)

    Tipo de valor

    Subtipo de valor

    Significado

    Valores de Uso

    Valor de uso Direto

    Resultante do uso direto humano dos ecossistemas, podem ser de consumo, matérias-primas ou não-consumo (ex.: benefício estético da paisagem).

    Valor de uso Indireto

    Derivado dos serviços de suporte e regulação fornecidos pelas espécies e ecossistemas (benefícios das funções dos ecossistemas como p.ex. da qualidade da água).

    Valor de Opção

    Importância dada pelos indivíduos à futura disponibilidade de serviços de ecossistema em benefício próprio, podendo estes ser diretos ou indiretos (p.ex.: assegurar o serviço de resiliência ao fogo pagando pela redução do risco de incêndio).

    Valor de não uso/ uso passivo

    Valor de Legado/ Herança

    Valor atribuído pelas pessoas de modo que as gerações futuras também beneficiem das espécies e ecossistemas (preocupações de equidade entre gerações, p.ex., preservar uma espécie).

    Valor de Existência

    Valor relacionado com a satisfação que os indivíduos adquirem pelo simples conhecimento que as espécies e os ecossistemas continuam a existir (conhecimento da continuidade da existência, p.ex., preservação de uma floresta nativa).

    Valor altruísta

    Valor atribuído pelos indivíduos para que outras pessoas da geração atual tenham acesso aos benefícios proporcionados pelas espécies e ecossistemas (preocupações de equidade intergeracional, p.ex., reduzir o risco de inundações que afetam grupos).

     

    O modelo de VET apresenta limites aplicados à valoração de serviços de ecossistema. Não permite:

    • capturar a integridade dos ecossistemas, visto que ainda não é possível operacionalizar a sua medição;
    • É incapaz de capturar benefícios coletivos, resultantes de valores partilhados (p.ex.: ligados ao sentido de lugar e à cultura). Aplicação limitada, sobretudo, ao nível dos serviços culturais.

    Voltando à questão dos métodos de valoração económica dos bens sem mercado, terminando assim este texto, convém referir que os métodos de preferência reveladas só medem VU, essencialmente de uso direto, enquanto os métodos de preferências declaradas são muito mais flexíveis. Os primeiros só podem ser utilizados para medir variações ex post à ocorrência na variação do nível de provisão do serviço e implicam a observação direta ou indireta do comportamento dos indivíduos. Em alguns casos, podem ser utilizados para medir benefícios indiretos ou mesmo de opção. Os segundos métodos abordados podem ser aplicados ex ante, permitindo capturar ganhos de perdas de bem-estar associadas a motivações ligadas à componente de VNU e, também, de VU. São então os métodos de preferências declaradas e a sua possibilidade de construção de mercados

     

    Fontes:

    Boyd, J., and S. Banzhaf. (2007). What are ecosystem services?  The need for standardized environmental accounting units.Ecological Economics 63,pp.616–626

    Chaves, C. (2017). Economia do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. MEGA – FEP.

    CICES (Common Classification of Ecosystem Services). (2016). Disponível em http://cices.eu/ (acedido a. 14/01/2018)

    Constanza, R., D’Arge, R., De Groot, R. ., Farber, S., Grasso, M., Hannon, B., van den Belt, M. (1997). The value of the world’s ecosystem services and natural capital. Nature, 87(6630), 253-260.

    Daily, G.(1997). Nature’s Services: Societal Dependence on Natural Ecosystems. Washington, DC: Island Press

    Daily, G. C., Söderqvist, T., Aniyar, S., Arrow, K., Dasgupta, P., Ehrlich, P. R., Folke, C., Jansson, A., Jansson, B., Kautsky, N., Lubchenco, J., Mäler, K., Simpson, D., Starrett, D., Tilman, D., Levin, S., Maler, K., & Walker, B. (2000). The value of nature and the nature of value. Science, 289(5478): 395–396.

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    Field, B., Field, M. (1994). Environmental Economics – An Introduction. McGraw-Hill.

    Fisher, B., e Turner, R. K. (2008). Ecosystem services: Classification for valuation. Biological Conservation, 141, 1167-1169.

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    Madureira, L. et al. (2013). Economia dos Serviços de Ecossistema – Um Guia para conhecer e valorizar serviços de agroecossistemas em áreas protegidas de montanha. Quercus – ANCN

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    Samuelson, P., & Nordhaus, W. (2010). Economics.

    TEEB (The Economics of Ecosystem and Biodiversity) (2010) A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade: Integrando a Economia da Natureza. Uma síntese da abordagem, conclusões e recomendações do TEEB.

    Wainger, L. a., King, D. M., Mack, R. N., Price, E. W., & Maslin, T. (2010). Can the concept of ecosystem services be practically applied to improve natural resource management decisions? Ecological Economics, 69(5): 978–987.