
20 anos da entrada em vigor do Protocolo de Quioto
O Protocolo de Quioto foi o primeiro tratado internacional juridicamente vinculativo a estabelecer metas concretas para a redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) nos países desenvolvidos. Surgindo como um complemento à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC), adotada em 1992, o protocolo reforçou o compromisso global para enfrentar o aquecimento global, baseando-se no princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas.
A estrutura do Protocolo de Quioto
O Protocolo de Quioto foi adotado em 11 de dezembro de 1997 e entrou em vigor a 16 de fevereiro de 2005, após ter sido ratificado por pelo menos 55 países que representassem, no mínimo, 55% das emissões globais de GEE dos países desenvolvidos. Esta condição foi essencial para garantir que o tratado tivesse um impacte significativo na redução global das emissões.
O acordo distinguiu os países em dois grandes grupos:
- Países desenvolvidos (Anexo I) – Este grupo inclui países que, devido ao seu elevado nível de industrialização, assumiram compromissos de redução das emissões. Dentro deste grupo, o Anexo B do Protocolo especifica quais destes países estão obrigados a cumprir metas quantificadas de redução. No entanto, alguns países desenvolvidos, como a Turquia, não assumiram compromissos obrigatórios.
- Países em desenvolvimento (conhecidos como os “não-Anexo I”) – Incluem-se os países que não estavam obrigados a cumprir metas de redução de emissões, mas que podiam beneficiar de mecanismos de financiamento e transferência de tecnologia para apoiar a mitigação das alterações climáticas e a adaptação aos seus efeitos.
O protocolo estabeleceu ainda mecanismos próprios de governação, incluindo a Reunião das Partes (MOP – Meeting of the Parties), que ocorre anualmente, e órgãos subsidiários que se reúnem semestralmente para monitorizar e implementar as suas disposições, garantindo a transparência e o cumprimento dos compromissos assumidos. Por razões logísticas, as reuniões das Partes à Convenção e Protocolo coincidem no tempo.

Figura 1. O diário japonês Japan Times destacou o Protocolo de Quioto na capa da sua edição de 12 de dezembro de 1997. Fonte: Japan Times via Público (Azul)
Metas e períodos de compromisso
O Protocolo de Quioto definiu dois períodos de compromisso para a redução das emissões de GEE:
- Primeiro período (2008-2012): Os países participantes comprometeram-se a reduzir, em média, 5% das suas emissões em relação aos níveis de 1990. A União Europeia (UE) e os seus Estados-Membros acordaram uma meta conjunta de redução de 8%.
- Segundo período (2013-2020): Estabelecido na Conferência de Doha em 2012, definiu uma nova meta de redução de 18% em relação a 1990. A UE, os seus Estados-Membros e a Islândia comprometeram-se a uma redução conjunta de 20%.
Para facilitar o cumprimento das metas, foram criados três mecanismos de mercado:
- Comércio de licenças de emissão – Permitia a compra e venda de créditos de carbono entre países.
- Aplicação conjunta de projetos – Incentivava investimentos em projetos de redução de emissões entre países do Anexo I.
- Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) – Permitia que países desenvolvidos compensassem as suas emissões financiando projetos de redução em países em desenvolvimento.
O cumprimento das metas foi monitorizado através de registos precisos das emissões e transações efetuadas. A Comissão Europeia publicou regularmente relatórios de progresso sobre o desempenho dos Estados-Membros da UE.
O impacte e herança do Protocolo de Quioto
Duas décadas após a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, o seu impacte continua a ser debatido. Se, por um lado, o tratado marcou o início das políticas climáticas globais e introduziu a lógica do mercado de carbono, por outro, várias análises apontam falhas na sua eficácia.
Uma das principais críticas ao Protocolo de Quioto prende-se com o facto de ter focado a responsabilidade na produção de emissões e não no consumo. Os países eram responsabilizados pelas emissões produzidas dentro das suas fronteiras, mas não pelas emissões associadas aos bens que importavam.
Outro problema relevante foi a alteração do panorama geopolítico global. Quando Quioto foi assinado, os principais emissores eram os Estados Unidos e a União Europeia. No entanto, a partir de 2006, a China ultrapassou os Estados Unidos como o maior emissor global, e a Índia aproximava-se das emissões da União Europeia, evidenciando a necessidade de um acordo climático mais abrangente.
Além disso, o Protocolo de Quioto não estabeleceu penalizações eficazes para os países que não cumpriram as metas acordadas. A ausência de mecanismos de sanção comprometeu a credibilidade do tratado e reduziu o seu impacte real e prático.
Outro ponto de debate foi a dependência excessiva dos mercados de carbono. A flexibilidade proporcionada pelo comércio de emissões permitiu que algumas nações evitassem reduções efetivas de poluição, utilizando créditos de carbono em vez de implementar medidas estruturais para diminuir as suas emissões.
A recusa dos Estados Unidos em ratificar o tratado também representou um grande revés para Quioto. Sendo um dos maiores emissores de GEE, a sua ausência enfraqueceu significativamente a abrangência e impacte do protocolo.
Por fim, a eficácia das metas estabelecidas foi limitada. Muitos países não conseguiram atingir as reduções propostas, enquanto outros utilizaram os mecanismos de flexibilidade de forma a cumprir formalmente os objetivos, sem que houvesse uma diminuição real das emissões.
Um falhanço ou um pilar das políticas climáticas?
Apesar das suas limitações, o Protocolo de Quioto lançou as bases para futuras negociações climáticas e influenciou a criação do Acordo de Paris em 2015. A experiência adquirida na definição de metas e mecanismos de monitorização foi essencial para a formulação de regras mais robustas no novo acordo global.
Se Quioto não tivesse existido, a negociação do Acordo de Paris teria sido muito mais difícil, pois muitas das diretrizes estabelecidas já tinham sido amplamente discutidas e testadas ao longo dos anos. O seu verdadeiro legado não está apenas na redução das emissões, mas sim na criação de um enquadramento internacional que permitiu uma abordagem coordenada e sustentada para enfrentar a crise climática.
Embora tenha sido amplamente criticado, Quioto representou um primeiro passo na luta contra as alterações climáticas, servindo como um ensaio para mecanismos que hoje são centrais nas políticas climáticas internacionais. O mercado de carbono e a diferenciação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento continuam a ser conceitos essenciais, agora refinados no Acordo de Paris.
Referências
Agência Portuguesado Ambiente (APA), 2021. Protocolo de Quioto. URL: https://apambiente.pt/clima/protocolo-de-quioto [Acedido em fevereiro de 2025]
Público, 2025. Protocolo de Quioto existe há 20 anos. Qual é o legado deste acordo global para o clima? URL: https://www.publico.pt/2025/02/15/azul/noticia/protocolo-quioto-existe-ha-20-anos-legado-acordo-global-clima-2122681. [Acedido em fevereiro de 2025]