
Gestão das populações de peixes da UE: Porque é que há cotas para a pesca?
Com a chegada das festas dos Santos Populares, a sardinha volta a ocupar um lugar de destaque nas tradições portuguesas. Em 2025, a pesca desta espécie emblemática foi retomada a 21 de abril, após quatro meses de interrupção determinada por critérios legais e científicos. Este ano, Portugal beneficia de uma quota de 34 406 toneladas, um aumento de 5 000 toneladas face a 2024, refletindo uma avaliação positiva do estado do recurso.
Esta limitação temporária e o sistema de quotas que a acompanha são resultado direto da gestão sustentável dos recursos marinhos, enquadrada na Política Comum das Pescas (PCP) da União Europeia (UE). Mas, afinal, porque é que existem quotas de pesca? E como se define quem pode pescar, o quê e em que quantidade? Hoje explicamos os princípios por detrás desta gestão e a sua importância para o futuro da pesca na Europa.
A importância de gerir os recursos haliêuticos
O peixe e os produtos da aquicultura são elementos essenciais de uma alimentação saudável e de setores económicos estratégicos para muitos Estados-Membros. A UE é o maior mercado mundial de produtos do mar, com um consumo médio anual de 24,4 kg por habitante, dos quais 75% provêm da pesca selvagem (Conselho da UE, 2023).
No entanto, os recursos haliêuticos são finitos. A sobrepesca, as alterações climáticas e a degradação dos ecossistemas marinhos têm vindo a comprometer a capacidade de regeneração das espécies, colocando em risco a biodiversidade, a viabilidade das atividades piscatórias e a segurança alimentar. Sem uma gestão rigorosa, algumas populações de peixes podem colapsar, com impacte económico, social e ambiental.
Como a UE gere as pescas: TAC, quotas e acordos
Para enfrentar este desafio, a UE aplica a Política Comum das Pescas, que tem como objetivo garantir uma exploração responsável e sustentável dos recursos marinhos. A base técnica deste sistema assenta na definição anual dos Totais Admissíveis de Captura (TAC), os limites máximos de captura por espécie, com base em pareceres científicos, nomeadamente do Conselho Internacional para a Exploração do Mar (ICES).
Estes limites são, depois, repartidos por cada Estado-Membro através de quotas nacionais, respeitando o princípio da estabilidade relativa, que tem em conta o histórico de capturas e a importância socioeconómica da pesca em cada país.
Sempre que os recursos piscatórios são partilhados com países terceiros, a UE recorre a acordos bilaterais ou multilaterais para definir, em conjunto, as possibilidades de pesca. Estes acordos internacionais são fundamentais para assegurar uma gestão coordenada e equitativa dos recursos a nível global.

Figura 1. Zonas Económicas Exclusivas (ZEE) dos Estados-Membros da União Europeia. As áreas a azul representam as zonas onde os países da UE detêm direitos exclusivos de exploração dos recursos marinhos, incluindo pesca. A gestão destes recursos é, na maioria dos casos, realizada de forma conjunta ao abrigo da Política Comum das Pescas da UE, garantindo uma abordagem coordenada à sustentabilidade e ao uso responsável dos ecossistemas marinhos. Fonte: Conselho da União Europeia.,2025.
O papel do Conselho da UE
O Conselho da UE desempenha um papel central no processo de decisão. Anualmente, os ministros responsáveis pela política das pescas reúnem-se para fixar as possibilidades de pesca para o ano seguinte, com base em propostas da Comissão Europeia e nas recomendações científicas.
Entre as suas principais competências estão:
- A fixação dos TAC para as principais unidades populacionais;
- A distribuição das quotas pelos Estados-Membros;
- A negociação e celebração de acordos internacionais de pesca.
Este processo decorre fora do procedimento legislativo ordinário, sendo uma prerrogativa exclusiva do Conselho no âmbito da PCP.
O caso de Portugal em 2025
Para 2025, Portugal conseguiu aumentar a sua quota de pesca em várias espécies, destacando-se:
- Mais de 18 000 toneladas de peixe, um aumento de 560 toneladas face a 2024;
- 300 toneladas de bacalhau no Canadá, retomando a pesca desta espécie naquela região ao fim de 32 anos de interdição.
Este aumento contrasta com as dificuldades enfrentadas por outros países, como Espanha, onde as quotas foram objeto de forte contestação. Em contrapartida, Portugal viu reconhecido o seu esforço de gestão sustentável, ainda que tenha sido necessário ajustar a atividade devido à redução de 26% da quota de bacalhau na Noruega (Fonte: Euronews, 2024).
Estas decisões são exemplos concretos de como a gestão europeia das pescas procura equilibrar os interesses económicos, a proteção dos recursos e o cumprimento de compromissos internacionais.
Conclusão
As cotas de pesca não são apenas restrições: são instrumentos fundamentais para assegurar a sustentabilidade dos recursos marinhos, garantir a continuidade da atividade piscatória e proteger os ecossistemas. A gestão partilhada no âmbito da Política Comum das Pescas da UE permite um equilíbrio entre a exploração económica e a conservação da biodiversidade, essencial para que tradições como a sardinhada continuem a existir no futuro.
Referências
Conselho da União Europeia.,2025. Gestão das unidades populacionais de peixes da UE. URL: https://www.consilium.europa.eu/pt/policies/eu-fish-stocks/ [Acedido em maio de 2025]
Euronews, 2024. UE chega a acordo sobre quotas de pesca, apesar dos protestos dos pescadores. URL: https://pt.euronews.com/2024/12/11/ue-chega-a-acordo-sobre-quotas-de-pesca-apesar-dos-protestos-dos-pescadores [Acedido em maio de 2025]