O combate aos resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE)
Como analisado no texto do blog da semana passada, o qual pode aceder aqui, os resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE) estão a tornar-se uma ameaça cada vez mais significativa. Este tipo de resíduos, que têm aumentado exponencialmente devido ao rápido avanço tecnológico e à crescente procura por novos dispositivos, contém substâncias tóxicas que, se não forem devidamente tratadas, podem causar graves danos ao ambiente e à saúde humana. Por esta razão, a União Europeia (UE) e os Estados-Membros, incluindo Portugal, têm implementado diversas medidas e legislação para mitigar o impacte destes resíduos, promovendo uma economia circular e práticas sustentáveis.
Legislação da UE sobre REEE
A legislação da UE sobre REEE tem evoluído significativamente ao longo dos anos, sendo a Diretiva 2012/19/UE uma das principais normas que regem a gestão destes resíduos.
- Diretiva 2012/19/UE sobre REEE
A Diretiva 2012/19/UE, conhecida como Diretiva REEE, estabelece um quadro regulamentar para garantir a gestão adequada dos REEE em toda a UE. O principal objetivo é reduzir o impacte ambiental e promover uma economia circular, onde os recursos são utilizados de forma eficiente e sustentável.
A Diretiva REEE define metas ambiciosas e progressivas para a recolha e tratamento de REEE, que devem ser atingidas pelos Estados-Membros:
- Taxa de Recolha: A partir de 2019, todos os Estados-Membros devem assegurar uma taxa de recolha anual de, pelo menos, 65% do peso médio dos equipamentos colocados no mercado nos três anos anteriores ou 85% dos REEE produzidos no território nacional. Esta meta visa garantir que uma quantidade significativa de resíduos seja recolhida e tratada de forma adequada, evitando a deposição em aterros ou o seu tratamento inadequado;
- Reciclagem e Valorização: A diretiva também impõe metas específicas para a reciclagem e valorização dos REEE. Dependendo do tipo de equipamento, uma determinada percentagem dos resíduos recolhidos deve ser reutilizada, reciclada ou valorizada. Estas metas variam entre 50% e 80%, consoante a categoria de equipamento, incentivando o máximo aproveitamento de matérias-primas secundárias.
- Medidas de prevenção e economia circular
Para além das metas de recolha e reciclagem, em abril de 2024, o Parlamento adotou a diretiva relativa ao direito à reparação, que tem como objetivo facilitar a reparação e prolongar a vida útil dos equipamentos, permitindo aos consumidores reparar os seus dispositivos em vez de os substituírem. Esta medida é crucial para reduzir a quantidade de resíduos gerados e fomentar a durabilidade dos produtos.
Mesmo após o final da garantia legal, os fabricantes continuam a ser obrigados a reparar equipamentos domésticos comuns que sejam tecnicamente reparáveis, como máquinas de lavar roupa, aspiradores e até smartphones, conforme estabelecido na legislação da UE. A lista de categorias de produtos pode ser alargada ao longo do tempo, abrangendo mais tipos de dispositivos. Os consumidores também têm a possibilidade de solicitar um aparelho temporário enquanto o seu está em reparação. Caso o dispositivo não seja reparável, o consumidor poderá receber um produto recondicionado em substituição.
Outro ponto relevante é o incentivo ao design ecológico dos produtos, que facilita o desmantelamento, a reparação e a reciclagem. Esta abordagem, prevista na Diretiva 2009/125/CE, assegura que os produtos são concebidos para minimizar o seu impacte ambiental ao longo de todo o ciclo de vida.
- Porta de carregamento USB-C
Ao abrigo das novas regras, os consumidores deixarão de necessitar de um carregador diferente sempre que adquirirem um novo dispositivo, podendo utilizar um carregador único para uma variedade de dispositivos eletrónicos portáteis de pequena e média dimensão.
Uma das medidas importantes que será implementada até ao final de 2024 é a obrigatoriedade de que todos os dispositivos eletrónicos comercializados na UE, como telemóveis, tablets e câmaras, estejam equipados com uma porta de carregamento USB-C. Esta medida faz parte de um esforço mais abrangente para reduzir os resíduos eletrónicos, permitindo que os consumidores usem um único carregador para diversos dispositivos, eliminando a necessidade de múltiplos carregadores.
A partir de 2026, esta obrigação será também alargada aos computadores portáteis, reforçando a padronização dos carregadores e a redução de resíduos.
Legislação portuguesa sobre REEE
Em Portugal, a legislação que regula a gestão dos REEE está totalmente alinhada com as diretrizes europeias. O Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro, estabelece o regime jurídico da gestão de fluxos específicos de resíduos, incluindo os REEE. Este diploma unifica a gestão de vários tipos de resíduos, baseando-se no princípio da responsabilidade alargada do produtor, que impõe aos fabricantes a responsabilidade de financiar e organizar sistemas de recolha e tratamento dos equipamentos no final do seu ciclo de vida.
Uma medida de destaque na legislação portuguesa é a Resolução da Assembleia da República n.º 33/2021, que recomenda ao governo uma recolha e tratamento eficazes dos gases de refrigeração presentes em equipamentos como aparelhos de ar condicionado e frigoríficos. Estes gases têm um impacte significativo no aquecimento global se não forem devidamente tratados, pelo que a sua correta gestão é crucial para a mitigação das alterações climáticas.
Portugal também tem implementado programas e campanhas de sensibilização para incentivar os consumidores a participarem ativamente na gestão responsável dos seus resíduos elétricos e eletrónicos. Paralelamente à legislação, existem iniciativas locais que promovem a reciclagem adequada e o prolongamento da vida útil dos equipamentos, através da reparação e reutilização.
O que podemos fazer em casa?
Embora a legislação seja fundamental para promover a gestão adequada dos REEE, os consumidores também têm um papel essencial na redução deste tipo de resíduos. Existem várias práticas que podemos adotar no nosso dia a dia para minimizar o impacte ambiental dos equipamentos eletrónicos:
- Evitar trocas desnecessárias de dispositivos: não devemos trocar os nossos equipamentos apenas porque saiu um novo modelo, mas sim prolongar o seu uso até que realmente deixem de satisfazer as nossas necessidades.
- Comprar equipamentos de boa qualidade: equipamentos de melhor qualidade tendem a durar mais tempo, o que reduz a necessidade de substituições frequentes.
- Reparar os equipamentos sempre que possível: em vez de descartar um dispositivo avariado, devemos tentar repará-lo, especialmente se ainda estiver em boas condições para uso.
- Descarte correto dos REEE: Quando for necessário eliminar um equipamento, devemos entregá-lo nos pontos de recolha adequados, como ecocentros ou lojas que aceitem a devolução de equipamentos em fim de vida.
Rede Electrão
Em Portugal, o Electrão desempenha um papel central na gestão de REEE. Fundado em 2005, o Electrão é uma entidade responsável pela gestão de REEE, pilhas e embalagens, colaborando com mais de 2 000 empresas para assegurar o correto encaminhamento e tratamento destes resíduos. Através das suas campanhas e parcerias, esta entidade promove a reciclagem e contribui para a redução dos resíduos perigosos que, de outra forma, acabariam por ser depositados em aterros ou incinerados.
O Electrão também participa ativamente em fóruns europeus, partilhando boas práticas e incentivando inovações no setor da gestão de resíduos. Além disso, a entidade desenvolve iniciativas de sensibilização junto dos consumidores para promover uma maior sensibilização sobre a importância da reciclagem e da reutilização de equipamentos eletrónicos.
Com a colaboração de todos — governos, empresas e consumidores — é possível reduzir significativamente a quantidade de resíduos elétricos e eletrónicos e contribuir para um futuro mais sustentável.
Referências
Diário da República. (2017). Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro. URL: https://files.diariodarepublica.pt/1s/2017/12/23602/0008800135.pdf. [Acedido em setembro de 2024]
Diário da República. (2020). Resolução da Assembleia da República n.º 33/2021, de 18 de dezembro de 2020. URL:https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/155939065/details/normal?q=Resolu%C3%A7%C3%A3o+da+Assembleia+da+Rep%C3%BAblica+n.%C2%BA%2033%2F2021%2C%20de+18+de+dezembro+de+2020. [Acedido em setembro de 2024]
Electrão. (2024). Rede Electrão. URL: https://www.electrao.pt/rede-electrao/. [Acedido em setembro de 2024]
Greenly. (2024). Why e-waste is becoming an issue. URL: https://greenly.earth/en-us/blog/ecology-news/why-e-waste-is-becoming-an-issue. [Acedido em setembro de 2024]
Parlamento Europeu. (2012). Diretiva 2012/19/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de julho de 2012, relativa aos resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE). Jornal Oficial da União Europeia. URL:https://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2012:197:0038:0071:PT:PDF. [Acedido em setembro de 2024]
Parlamento Europeu. (2020). Resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos na UE: Factos e números. URL: https://www.europarl.europa.eu/topics/pt/article/20201208STO93325/residuos-de-equipamentos-eletricos-e-eletronicos-na-ue-factos-e-numeros. [Acedido em setembro de 2024]
Parlamento Europeu. (2022). Carregador comum será finalmente uma realidade em 2024. URL: https://www.europarl.europa.eu/news/pt/press-room/20220930IPR41928/carregador-comum-sera-finalmente-uma-realidade-em-2024. [Acedido em setembro de 2024]