Práticas de agricultura regenerativa
Como analisado na semana passada, a agricultura regenerativa é essencial para enfrentar os desafios da agricultura atual, particularmente no que se refere à missão de alimentar de forma sustentável uma população global em crescimento.
Este tipo de agricultura pode ser adotado em todas as regiões onde a atividade agrícola existe, independentemente da sua escala. No texto do blog desta semana, abordamos as principais práticas de agricultura regenerativa.
Técnicas de agricultura regenerativa
As técnicas a implementar podem variar significativamente consoante a localização, o tipo de produção e as condições ambientais. Assim, é crucial que as práticas sejam adaptadas à realidade local, tendo em conta fatores como a geografia, a biodiversidade e as especificidades sociais e económicas da região. Apenas com esta abordagem cuidadosa será possível selecionar as técnicas mais eficazes e garantir o sucesso da agricultura regenerativa.
De seguida, enumeramos algumas destas práticas:
- Práticas agrícolas com redução/eliminação da lavra
Quando o solo é mantido sem ser lavrado, a diversidade microbiana aumenta, melhorando a saúde e estrutura do solo e tornando-o mais resistente a fatores de stress nas culturas. Estas práticas também ajudam a reduzir a erosão e o escoamento agrícola, ou seja, a água da chuva ou irrigação que flui sobre o solo, levando consigo nutrientes, fertilizantes e pesticidas para rios e lagos, causando poluição. Ao minimizar este escoamento, evita-se a perda de solo fértil e protege-se a qualidade das águas.
Para os agricultores, a adoção de práticas com pouca ou nenhuma lavra oferece benefícios como maior retenção de água, maior disponibilidade de nutrientes e aumento da matéria orgânica no solo. Além disso, reduzem-se os custos, como a menor necessidade de fertilizantes e o menor uso de máquinas.
- Culturas de cobertura
Promover o crescimento contínuo no solo é essencial para a sua saúde e para a agricultura regenerativa. As culturas de cobertura ajudam a fixar CO2 da atmosfera, sequestrando carbono como matéria orgânica, melhorando a biologia do solo e acrescentando nutrientes, enquanto reduzem a erosão.
Estas culturas também “recuperam” nutrientes em excesso após a colheita, armazenando-os e reciclando-os até à próxima época de plantação. Além disso, reduzem a lixiviação de fertilizantes para as águas subterrâneas e o escoamento agrícola. Culturas leguminosas, por exemplo, podem fixar azoto no solo, diminuindo a necessidade de fertilizantes na época seguinte.
Em sistemas de culturas permanentes, as culturas de cobertura podem ser plantadas entre filas, ajudando a proteger o solo da erosão, a suprimir ervas daninhas e até a fornecer habitat para polinizadores. No geral, são uma ferramenta fundamental para sequestrar carbono, reciclar nutrientes, reduzir fertilizantes sintéticos e melhorar a saúde e estrutura do solo, contribuindo para a produtividade e sustentabilidade das colheitas.
- Compostagem
A construção de matéria orgânica no solo é crucial para regenerar solos esgotados, sendo a compostagem de materiais biológicos, como resíduos de culturas, restos de alimentos e estrume animal, uma prática essencial na agricultura regenerativa. Estes materiais contêm carbono, que ao ser incorporado no solo se decompõe lentamente, formando matéria orgânica estável, fundamental para melhorar a estrutura e fertilidade do solo a longo prazo. A compostagem acelera este processo, tornando os nutrientes mais rapidamente disponíveis para os microrganismos e plantas. Além disso, o composto liberta os nutrientes de forma gradual e contínua, proporcionando uma fertilização mais sustentável e duradoura em comparação com os fertilizantes convencionais.
- Aumentar a diversidade de plantas
A diversidade de plantas sempre foi um fator-chave para a saúde dos solos, especialmente antes da intensificação da agricultura com monoculturas. Nesta prática, apenas uma cultura é cultivada repetidamente e tal tem vindo a esgotar os solos, tornando-os mais dependentes de fertilizantes e levando à perda de matéria orgânica.
A rotação de culturas surge como uma solução regenerativa, imitando a diversidade natural que antigamente enriquecia os solos. Alternar diferentes culturas ao longo do tempo ajuda a melhorar a estrutura do solo, aumentar a sua fertilidade e promover o desenvolvimento de microrganismos essenciais. Ao diversificar as plantas, estamos a restabelecer o equilíbrio do solo, tornando-o mais resiliente e produtivo e, consequentemente, a reduzir a necessidade de fertilizantes químicos.
- Agricultura orgânica
A agricultura industrial e o uso massivo de fertilizantes enfraqueceram a saúde do solo e a biodiversidade, essenciais para a sustentabilidade. Nos últimos 30 anos, o movimento biológico provou que é possível cultivar em larga escala sem comprometer a qualidade ou o rendimento. As práticas orgânicas ajudam a regenerar o solo e reduzem a necessidade de fertilizantes sintéticos.
Em Portugal, 7% das terras agrícolas são cultivadas com métodos sustentáveis, uma percentagem que está em linha com a média europeia nesta área (Eurostat, 2019).
Os números do gabinete de estatística da UE mostram que Portugal supera países como a Alemanha (6,8%) e França (6%), mas ainda está distante do pódio, ocupado pela Áustria (23,4%), Estónia (19,6%) e Suécia (19,2%).
No conjunto da União Europeia, considerando tanto as terras certificadas como áreas de produção biológica como as terras em conversão, a área dedicada à agricultura biológica somava 12,6 milhões de hectares em 2017, representando um aumento de 25% em relação a 2012, conforme indicado neste estudo baseado nos dados mais recentes do sector (Expresso, 2019).
- Integração de animais
Historicamente, o gado e as culturas agrícolas coexistiram de forma benéfica. No entanto, com a industrialização, a produção pecuária foi separada das culturas, levando a desafios como o tratamento de resíduos animais, a qualidade da água e a saúde dos animais.
Integrar o pastoreio com a produção agrícola oferece várias vantagens. O pastoreio após a colheita ajuda a transformar resíduos ricos em carbono em estrume, promovendo o ciclo de nutrientes entre as culturas e o solo, além de ajudar na captura de carbono. Esta prática reduz muitos dos problemas associados à pecuária intensiva e contribui para a saúde do solo, dos animais e do ambiente.
- Pastoreio rotativo
No pastoreio rotativo, o campo é dividido em áreas menores com cercas portáteis, e os animais são rotativamente movidos entre estas áreas, conforme o número de animais e o crescimento das forragens. Este processo permite que as áreas desocupadas recuperem antes do retorno dos animais. Essa prática reduz a erosão do solo, melhora a infiltração da água e minimiza o escoamento, enquanto oferece uma nutrição de qualidade ao gado.
O pastoreio rotativo é uma prática essencial na agricultura regenerativa, pois melhora a saúde do solo, o ciclo de nutrientes e carbono, a qualidade das forragens, a saúde animal e a retenção de água, tudo enquanto reduz a erosão e o escoamento.
- Silvopastorícia
A silvopastorícia combina o pastoreio de animais com o cultivo de árvores na mesma área. Este sistema oferece benefícios adicionais em comparação com o pastoreio tradicional, criando receitas extras e reduzindo custos para as operações florestais. Entre as árvores, são plantadas forragens perenes, que servem de alimento para os animais, promovendo o ciclo de nutrientes e carbono no solo. Além disso, as árvores fornecem sombra no verão e proteção contra o vento, beneficiando o bem-estar animal.
Esta prática sinérgica melhora a saúde do solo, oferece nutrição tanto para os animais como para as plantas e cria uma fonte de rendimento extra para as operações florestais.
- Agrofloresta
Embora a agrofloresta inclua a silvopastorícia, esta prática abrange um conjunto mais amplo de técnicas que transformam grandes paisagens agrícolas, com impactes ambientais, sociais e económicos significativos. Além do pastoreio entre árvores, a agrofloresta inclui o cultivo entre fileiras de árvores, a agricultura florestal, zonas de proteção florestal entre campos agrícolas e cursos de água, e barreiras contra o vento.
Quando bem planeadas e geridas, estas práticas aumentam a diversidade de plantas, melhoram a saúde do solo, reduzem o escoamento agrícola, previnem a erosão do solo e criam habitats para a flora e fauna nativas. Do ponto de vista económico, criam fontes de rendimento, como o cultivo entre árvores, a exploração florestal, e a integração do pastoreio com a gestão florestal.
Conclusão
A agricultura regenerativa oferece uma abordagem sustentável e integrada para enfrentar os desafios da agricultura moderna, promovendo a saúde do solo, a biodiversidade e a sustentabilidade a longo prazo. As práticas apresentadas, como a redução da lavra, as culturas de cobertura, a compostagem e a rotação de culturas, entre outras, são ferramentas essenciais que, quando ajustadas às condições locais, podem trazer grandes benefícios tanto para os agricultores como para o meio ambiente. A adoção de técnicas como o pastoreio rotativo, a silvopastorícia e a agrofloresta realça a importância de um planeamento eficaz para otimizar os recursos e assegurar a regeneração dos solos e ecossistemas.
Na próxima semana, iremos explorar exemplos concretos da aplicação da agricultura regenerativa, demonstrando como estas práticas estão a ser implementadas com sucesso.
Referências
EOS. (2024). Agricultura regenerativa: O que é e como pode ser útil para os agricultores. URL:https://eos.com/pt/blog/agricultura-regenerativa/. [Acedido em setembro de 2024].
PhycoTerra. (2020). 10 Regenerative Agriculture Practices Every Grower Should Follow. URL: https://phycoterra.com/blog/10-regenerative-agriculture-practices/. [Acedido em setembro de 2024].
BeeCircular. (2023). Agricultura Regenerativa: O Futuro da Agricultura. URL: https://www.beecircular.org/post/agricultura-regenerativa. [Acedido em setembro de 2024].
Expresso. (2019). Agricultura biológica. Quota em Portugal é de 7%, em linha com a média da EU. URL: https://expresso.pt/economia/2019-10-16-Agricultura-biologica.-Quota-em-Portugal-e-de-7-em-linha-com-a-media-da-UE. [Acedido em setembro de 2024].