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    Restauro ecológico após o incêndio: mais do que crescimento florestal, um compromisso com a resiliência climática

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    Restauro ecológico após o incêndio: mais do que crescimento florestal, um compromisso com a resiliência climática

    A zona mediterrânica, reconhecida por acolher uma das maiores biodiversidades do mundo, é composta por florestas de elevado valor ecológico, singularidade e diversidade. No entanto, de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), esta é também uma das regiões mais vulneráveis da Europa, enfrentando ameaças crescentes devido às alterações climáticas.

    Estas mudanças têm contribuído significativamente para o aumento do número de incêndios e da extensão das áreas ardidas. Neste contexto não é suficiente apenas reforçar a capacidade de resposta aos incêndios; torna-se essencial integrar o restauro ecológico nas estratégias de gestão florestal, garantindo uma recuperação sustentável e resiliente desses ecossistemas.

     

    O que é o restauro ecológico?

    O restauro ecológico, conforme definido pela Society for Ecological Restoration (SER, 2004), é o processo que visa auxiliar na recuperação de ecossistemas que foram degradados, danificados ou destruídos. No contexto das florestas, o principal objetivo é melhorar a estrutura, a funcionalidade e os serviços dos ecossistemas, aumentando assim a resiliência e a biodiversidade das áreas afetadas. Tradicionalmente associado à simples reflorestação, o restauro ecológico “moderno” foca-se na melhoria qualitativa das florestas existentes e não apenas na expansão da área florestal.

    Os principais objetivos do restauro ecológico são:

    • Criação de paisagens diversificadas: Desenvolver ecossistemas sustentáveis e rentáveis, capazes de resistir a impactes futuros;
    • Restauração das funções florestais: As florestas devem voltar a fornecer recursos vitais como água e ar de qualidade, além de proteção contra inundações e contribuir para a regulação climática;
    • Melhoria da qualidade ecológica: Priorizar as florestas autóctones com diversidade de espécies e idades, favorecendo a biodiversidade e a variedade de habitats;
    • Promoção da diversidade económica: Utilizar os recursos florestais como base para diferentes atividades económicas nas zonas rurais.

     

    Os erros do passado em Portugal

    A gestão florestal em Portugal tem sido marcada por decisões que, embora visassem a rentabilidade económica, acabaram por comprometer a resiliência dos ecossistemas. Historicamente, o país priorizou o plantio de espécies de rápido crescimento, como o eucalipto, para atender às necessidades das indústrias de papel e madeira. Atualmente, o eucalipto ocupa cerca de 26% da área florestal de Portugal, superando outras espécies nativas como o sobreiro e o pinheiro-bravo.

    Esta predominância do eucalipto resulta em grande parte de políticas de gestão florestal que, ao longo dos anos, incentivaram a sua plantação em detrimento da biodiversidade e da sustentabilidade a longo prazo. Um exemplo claro disso é o Decreto-Lei nº 96/2013, popularmente conhecido como a “Lei do Eucalipto”. Este decreto facilitou o processo de arborização e rearborização com eucalipto, removendo muitas das restrições que existiam para o plantio desta espécie.

    Embora a intenção tenha sido simplificar a gestão florestal e estimular a economia, a “Lei do Eucalipto” acabou por promover as monoculturas num momento em que a floresta nacional já estava vulnerável devido a fatores como as mudanças climáticas e o abandono rural. A falta de diversidade florestal aumentou o risco de incêndios florestais, que se tornaram mais frequentes e intensos, além de comprometer a saúde dos solos e reduzir a biodiversidade.

    No entanto, houve um ponto de inflexão em que Portugal começou a tomar medidas para a recuperação das florestas. Os incêndios devastadores que ocorreram em 2017, especialmente em Pedrógão Grande em junho e no Centro do país em outubro, seguidos pelos incêndios em Monchique (2018) e na Serra da Estrela (2022), impulsionaram uma reforma florestal. Esta reforma teve como principal objetivo melhorar a gestão e o ordenamento florestal em Portugal, restringir a expansão do eucalipto e combater de forma mais eficaz os incêndios florestais.

     

    Figura 1. Incêndio no distrito de Vila Real em 2022. Fonte: ANP | WWF. (2024)

     

    Esta reforma já começa a dar frutos. Em 2023, pela primeira vez em muitos anos, não houve vítimas mortais causadas por incêndios florestais. Além disso, em 2024, até ao momento, registou-se o menor número de incêndios da última década. Estes resultados indicam que as novas estratégias de gestão florestal estão a ter um impacte positivo, ajudando a proteger tanto as pessoas como os ecossistemas.

     

    Exemplo de restauro ecológico em Portugal – Projeto plantar água

    O grande incêndio de 2012 na Serra do Caldeirão, que consumiu cerca de 24 800 hectares, destacou a necessidade urgente de ações de restauro na região. Em resposta, a ANP|WWF lançou em 2019 o projeto Plantar Água, como parte de uma iniciativa mais ampla que começou em 2007. O projeto focou-se na recuperação de 100 hectares de áreas degradadas, através da plantação de espécies nativas como sobreiro e medronheiro, da criação de florestas corta-fogo para prevenir a propagação de incêndios, e da recuperação de galerias ripícolas.

     

     

    Os primeiros resultados foram positivos, com a paisagem a tornar-se mais resiliente aos incêndios e a biodiversidade local a começar a recuperar. Além disso, o projeto ajudou a revitalizar a economia local, promovendo atividades sustentáveis como a produção de medronho e cortiça.

    Um dos importantes benefícios estimados é a recuperação de mais e melhor água para todos os usos e milhares de utilizadores. Considerando a floresta madura em 2050, a ANP|WWF estima que haja uma recuperação de 200-250 milhões de litros de água/ano, um ganho de cerca de 20% na quantidade de água disponível para o solo e para as plantas. O relatório técnico final do “Plantar Água” pode ser consultado aqui.

    A segunda edição deste projeto interveio num total de 120 hectares e promoveu diversas formas de sustentar a floresta da Serra, como é exemplo a plantação de espécies nativas e a instalação de abrigos e alimentadores para o coelho-bravo. Foram ainda realizadas várias iniciativas de empreendedorismo local ligadas à natureza e ações de educação e sensibilização ambiental com escolas da região, a mais significativa das quais a inauguração de uma Estação de Biodiversidade junto à Ribeira da Foupana, no concelho de Tavira – um percurso pedestre de cerca de 2,5 km com painéis informativos sobre as espécies de animais e plantas presentes naquela área. Pode consultar as coordenadas do trilho aqui.

    O “Plantar Água” demonstra como o restauro ecológico pode contribuir para a proteção contra incêndios e para o desenvolvimento sustentável, servindo de modelo para outras regiões.

     

     

    Referências

    ANP | WWF. (2024). Restaurar para prevenir: Proposta ibérica da WWF para promover paisagens resilientes aos incêndios. URL : https://wwfeu.awsassets.panda.org/downloads/anp_wwf_relatorio_incendios_2024_vf.pdf [Acedido em agosto de 2024]

    Reis, M. (2018). A floresta em Portugal: Gestão, monoculturas (eucaliptização) e incêndios. Revista Cerna, nº 79. URL : https://adega.gal/web/media/documentos/floresta_em_portugal_def.pdf [Acedido em agosto de 2024]

    Observador. (2024, 10 de julho). Incêndios: Restauro da natureza é a melhor forma de prevenir, diz WWF Ibérica. URL : https://observador.pt/2024/07/10/incendios-restauro-da-natureza-e-a-melhor-forma-de-prevenir-diz-wwf-iberica/ [Acedido em agosto de 2024]