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    Lancet Report: Conseguimos alimentar a população de forma saudável dentro dos limites do planeta?

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    Lancet Report: Conseguimos alimentar a população de forma saudável dentro dos limites do planeta?

    A alimentação é crucial tanto para a saúde humana como para a sustentabilidade ambiental, mas, atualmente, representa uma ameaça a ambos. Face ao crescimento da população mundial, surge o desafio de garantir dietas saudáveis a partir de sistemas alimentares sustentáveis (SAS). Apesar da produção global de alimentos ter acompanhado o aumento populacional, mais de 820 milhões de pessoas ainda sofrem de insegurança alimentar grave (Lancet Report, 2019) e muitas outras seguem dietas de baixa qualidade ou consomem em excesso. As dietas pouco saudáveis representam, atualmente, um risco maior para a saúde do que comportamentos de risco, tais como sexo inseguro e consumo de álcool, drogas e tabaco. Adicionalmente, o modo como os alimentos são produzidos ameaça a estabilidade climática e os ecossistemas, sendo o principal motor da degradação ambiental. Sem uma transformação radical do sistema alimentar, o mundo arrisca-se a não cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) e o Acordo de Paris, deixando às futuras gerações um planeta severamente degradado.

    Face a esta problemática, a Comissão EAT-Lancet convocou 37 cientistas de diversas disciplinas para desenvolver metas científicas globais para dietas saudáveis e uma produção alimentar sustentável, numa primeira tentativa de estabelecer metas universais para o sistema alimentar que beneficiem todas as pessoas e o planeta.

    Figura 1. O sistema alimentar global deve operar dentro dos limites da saúde humana e da produção de alimentos para garantir dietas saudáveis a partir de sistemas alimentares sustentáveis para quase 10 mil milhões de pessoas até 2050. Fonte: Lancet Report, 2019

     

    Conseguir dietas saudáveis para quase 10 mil milhões de pessoas até 2050

    Os variados trabalhos recentes que têm surgido sobre os impactes ambientais das diversas dietas concluem, maioritariamente, que aquelas ricas em alimentos vegetais e com menos alimentos de origem animal são benéficas tanto para a saúde como para o ambiente, sendo descritas como “mutuamente vantajosas” (Lancet Report, 2019). Contudo, ainda não há um consenso global sobre o que define uma dieta saudável e uma produção de alimentos sustentável.

    Para abordar este desafio, a Comissão EAT-Lancet desenvolveu metas globais para dietas saudáveis e para a produção sustentável de alimentos, tendo por base as evidências científicas existentes. Estas metas foram integradas numa estrutura chamada espaço operacional seguro para sistemas alimentares. Este espaço é delimitado por alvos científicos que definem quantidades ideais de consumo de grupos de alimentos, como 100 a 300 g/dia de fruta, para otimizar a saúde humana, e alvos para uma produção de alimentos que assegure a estabilidade do sistema Terra. As fronteiras deste espaço representam um “espaço seguro”, e ultrapassá-las implicaria riscos crescentes para a estabilidade do sistema terrestre e a saúde humana. Estas diretrizes visam uma integração das metas de saúde e sustentabilidade, permitindo avaliar quais dietas e práticas de produção alimentar podem contribuir para a concretização dos ODS e do Acordo de Paris.

     

    Metas científicas para dietas saudáveis e produção de alimentos sustentáveis

    Meta 1: Dietas Saudáveis

    Uma dieta saudável é definida não apenas pela ausência de doenças, mas pelo estado de completo bem-estar físico, mental e social. De acordo com o Lancet Report, as metas científicas para dietas saudáveis são fundamentadas numa extensa revisão da literatura sobre alimentos, padrões alimentares e os seus impactos na saúde. Estas dietas ideais são caracterizadas por um consumo calórico ótimo, enfatizando uma ampla variedade de alimentos à base de plantas e limitando os alimentos de origem animal, preferindo gorduras não saturadas em detrimento das saturadas, e restringindo o consumo de cereais refinados, alimentos altamente processados e com açúcares adicionados.

    Para concretizar essas dietas saudáveis até 2050, serão necessárias mudanças substanciais. Isto inclui um aumento significativo no consumo de alimentos saudáveis, como frutas, vegetais, leguminosas e frutos secos, e uma redução superior a 50% no consumo global de alimentos menos saudáveis, tais como alimentos com açúcares adicionados e carne vermelha. Além disso, a utilização de alimentos de origem animal deve ser cuidadosamente considerada em cada contexto, respeitando as realidades locais e regionais, especialmente em populações que dependem da agropecuária e pesca e enfrentam desafios de desnutrição.

    Por fim, estima-se que a adoção dessas dietas poderá prevenir cerca de 11 milhões de mortes anualmente, o que representaria entre 19% e 24% do total de mortes entre adultos, como indicado no Lancet Report de 2019. Esta projeção enfatiza a importância vital de adaptar os padrões alimentares globais para melhorar a saúde pública e aumentar a longevidade.

    Figura 2. A “lacuna da dieta” entre os padrões alimentares atuais, a nível global, e a ingestão de alimentos na dieta da saúde planetária. Fonte: Lancet Report, 2019.

     

    Meta 2: Produção Sustentável de Alimentos

    A Comissão EAT-Lancet concentra-se em sistemas e processos biogeofísicos que interagem no sistema terrestre, particularmente entre o sistema climático e a biosfera, os quais são essenciais para regular o estado do planeta. Dado o impacte significativo da produção de alimentos nesses sistemas, foram identificadas seis áreas-chave para as quais existem provas científicas robustas que suportam a definição de objetivos quantificáveis. Estes incluem:

    • Alterações Climáticas: Limite de emissões de 4,7 a 5,4 Gt de CO2 equivalente por ano.
    • Mudança no Sistema Terrestre: Limite de alteração de uso do solo de 11 a 15 milhões de km² por ano.
    • Uso de Água Doce: Limite de utilização de 1000 a 4000 km³ de água por ano.
    • Ciclo de Azoto: Limite de 65 a 90 Tg de azoto por ano. Este limite pode ser estendido para 90 a 130 Tg N por ano caso sejam adotadas práticas de produção e redistribuição aprimoradas.
    • Ciclo de Fósforo: Limite de 6 a 12 Tg de fósforo por ano, podendo ser ajustado para 8 a 16 Tg P por ano se 50% do fósforo aplicado for reciclado.
    • Perda de Biodiversidade: Limite de 1 a 80 extinções por milhão de espécies por ano.

    Estes limites são propostos para assegurar que a produção global de alimentos se mantenha em níveis reduzidos, minimizando assim o risco de mudanças irreversíveis e potencialmente catastróficas no sistema terrestre.

     

    O alcance de dietas de saúde planetária

    O desafio de alcançar dietas sustentáveis para a saúde do planeta é significativo, especialmente com o crescimento da população mundial. A Comissão EAT-Lancet propõe medidas práticas, como a adoção de dietas de base vegetal, práticas sustentáveis de produção de alimentos e redução de perdas e desperdício alimentar. O objetivo é que, até 2050, os sistemas alimentares suportem dietas saudáveis para cerca de 10 mil milhões de pessoas dentro de limites ambientais seguros. Contudo, aumentos no consumo de carne vermelha ou lacticínios podem comprometer esse objetivo. É necessário um conjunto de mudanças significativas e uma abordagem integrada para garantir a sustentabilidade dos sistemas alimentares globais.

    Na próxima semana, prosseguiremos com a análise deste relatório, onde exploraremos as Cinco Estratégias propostas no relatório EAT-Lancet para uma Grande Transformação Alimentar.

     

    Referências

    EAT-Lancet Commission, 2019. Resumo do relatório da Comissão EAT-Lancet. URL: https://eatforum.org/content/uploads/2019/07/EAT-Lancet_Commission_Summary_Report_Portugese.pdf [Acedido em maio de 2024]