Certificações de Moda Sustentável
A indústria da moda é responsável por impactes ambientais e sociais negativos muito significativos, em diversas fases: exploração dos recursos, consumo excessivo de água e poluição da mesma na produção, emissão de gases com efeito de estufa no transporte e as toneladas de roupas que acabam em aterros. Como tal, é justo afirmar que o setor têxtil e vestuário tem um papel crucial a desempenhar na integração de melhores práticas ambientais e sociais e na contribuição para o desenvolvimento de uma economia circular que promova a reciclagem.
Existem muitas certificações, mas o que significam? Como podemos saber se as marcas estão a ser completamente transparentes? Na maioria das vezes, o consumidor não tem acesso à cadeia de produção e, quando tem, torna-se difícil perceber se aquilo que é comunicado por uma marca tem, na realidade, algum impacte no planeta e na vida de quem produz as peças compradas ou é greenwashing. Releia aqui!
Setor têxtil e do vestuário mais sustentável: Certificações
Para assegurar um setor têxtil e de vestuário mais sustentável as mudanças necessárias são vastas, sendo exemplo as seguintes medidas:
- Integrar a proteção do ambiente em cada fase da produção:
Promover uma abordagem de eco-design nos têxteis, utilizando fibras biológicas, ecológicas ou recicladas, reduzindo a utilização de água, limitando os produtos químicos poluentes, promovendo a reciclagem de materiais e respeitando o bem-estar animal.
- Assegurar o desenvolvimento de sectores socialmente responsáveis:
Permitir condições de trabalho dignas e seguras, estabelecer preços justos, promover relações comerciais éticas e sustentáveis a longo prazo.
- Proteger o sector para lidar com a complexidade da cadeia de abastecimento:
Assegurar a rastreabilidade e transparência até ao consumidor (incluindo a origem das matérias-primas naturais, biológicas ou recicladas) e controlar os riscos ambientais e sociais.
Neste sentido, têm vindo a ser desenvolvidas entidades independentes, especializadas em diferentes áreas da indústria que certificam cada produto de modo a garantir que as declarações das marcas não diferem das suas práticas corporativas. De seguida apresenta-se as cinco entidades certificadoras com presença mais global:
GLOBAL ORGANIC TEXTILE STANDARS (GOTS)
A Global Organic Textile Standards é uma das certificações de maior relevância no campo dos materiais orgânicos. Estabelecida em 2002, esta entidade tem sob a sua alçada mais de 10 mil empresas localizadas em 72 países.
Para que uma marca de Moda obtenha a aprovação GOTS no seu produto final, esta tem de garantir comportamentos de responsabilidade social e económica em cinco fases distintas: processamento inicial de materiais, fiação, tecelagem, coloração/tratamento químico e manufatura. O GOTS aplica-se a produtos compostos por fibras, lã, tecidos, roupas e tecidos para estofados, exceto produtos de couro. Destina-se a produtores de matérias-primas, processadores e fabricantes de têxteis, distribuidores, importadores, marcas ou qualquer interveniente do sector têxtil.
A certificação de têxteis biológicos e ecológicos garante:
- processos de produção e transformação amigos do ambiente
- respeito e melhoria das condições de trabalho
- promoção da utilização de fibras provenientes da agricultura biológica
- proibição de fatores de produção perigosos, tais como metais pesados tóxicos, solventes aromáticos, etc.
Apesar de transparecer igualmente uma vertente social, a essência desta entidade encontra-se na minimização dos impactes ambientes da indústria da Moda. Os produtos comercializados são verificados em conformidade com a norma GOTS, assegurando uma garantia ao longo de toda a cadeia de fornecimento até aos consumidores. Existem dois níveis de certificação.
Nível 1: Têxteis biológicos
- 95% mínimo de fibras provenientes da agricultura biológica
- 5% máximo de fibras sintéticas ou artificiais
Nível 2: têxteis contendo X% de fibras biológicas
- 70% no mínimo de fibras provenientes da agricultura biológica
- 10%, no máximo, de fibras sintéticas ou artificiais, este limiar é de 25% para calçado, roupa interior longa e roupa desportiva
- 30% de fibras não biológicas se as matérias-primas não forem biológicas, nem recicladas ou provenientes de uma gestão florestal sustentável
Assim, quando uma peça certificada pela GOTS chega às mãos do consumidor, tal significa que esta foi produzida com, pelo menos, 70% dos materiais cultivados e tratados de forma orgânica, sendo menos prejudicial para o planeta do que uma peça que siga um processo convencional.
BETTER COTTON INITIATIVE (BCI)
Apesar de ser uma fibra natural, são vários os problemas ambientais e sociais que estão associados ao cultivo de algodão. Este é não só um material com um grande impacte negativo, por exemplo, no consumo de água, mas também na saúde dos trabalhadores envolvidos na produção, devido à quantidade de produtos químicos tradicionalmente utilizados.
Como tal, foi instaurada, em 2009, uma organização inteiramente dedicada à certificação do cultivo e tratamento responsável do algodão. A Better Cotton Initiative (BCI) é uma entidade sem fins lucrativos que promove práticas mais sustentáveis na produção do material mais utilizado pela indústria da Moda. No final de 2020, esta contava com mais de 2 100 membros, cuja produção de algodão representava cerca de 23% do total mundial.
O Better Cotton Standard System (Figura 1) é uma abordagem holística da produção sustentável de algodão que alberga os três pilares da sustentabilidade: ambiental, social e económico. Cada um dos elementos – dos “Princípios e Critérios” até aos mecanismos de monitorização que mostram “Resultados e Impacte” – funcionam em rede de forma a apoiar o sistema, a credibilidade do algodão “Better Cotton” e da própria instituição. O sistema garante o intercâmbio de boas práticas e encoraja a ação coletiva para estabelecer o Better Cotton como um produto sustentável.
Figura 1. Better Cotton Standard System [Fonte: BCI, 2022]
Seguindo sete grandes princípios que englobam desde questões ambientais, como a preservação dos solos, até questões humanas, nomeadamente a garantia de boas condições de trabalho, uma peça de etiqueta BCI representará sempre um tipo de algodão “better grown”.
FAIR TRADE
A Fair Trade baseia-se na premissa de que tudo o que compramos tem um impacte na vida de quem nos rodeia e, por esse motivo, há que trabalhar para que tal resultado seja o mais positivo possível. Assim, um produto de etiqueta Fair Trade centra-se nos valores de sustentabilidade social, como a garantia de salários justos e condições dignas de trabalho.
A garantia da certificação Fair Trade:
- condições de trabalho decentes e seguras em toda a cadeia de abastecimento, independentemente do seu elo de cadeia e do país
- um preço de compra justo superior ao preço de mercado
- um sistema de proteção dos produtores em caso de crise: um preço mínimo garantido calculado com base nos custos de produção
- reforço da autonomia dos produtores
- práticas agrícolas amigas do ambiente encorajando a transição para a agricultura biológica
O sucesso que esta revelou na melhoria das condições sociais na indústria do café no final do século XX acabou por transbordar para outros setores e, hoje, é possível ver uma etiqueta Fair Trade em peças de roupa.
STANDARD 100 BY OEKO-TEX
Para a indústria da Moda, destaca-se o Standard 100: uma das etiquetas mais conhecidas entre o setor, cujo objetivo é garantir que os tecidos que colocamos sobre o nosso corpo não são prejudiciais à saúde humana. O mesmo se aplicará aos restantes componentes de uma peça de roupa, desde as linhas aos botões (Figura 2).
Figura 2. Materiais que podem ser certificados pela Standard 100 [Fonte: OEKO-TEX, 2022]
Na certificação Standard 100, os requisitos necessários à aprovação de cada tecido mudam de acordo com as categorias do produto. Por exemplo, peças que estão em contacto direto com a pele têm normas mais rígidas do que aquelas onde tal não se verifica. Por ser uma certificação baseada em critérios científicos, o Standard 100 revela ainda uma data de validade para cada produto têxtil.
Como observável na figura 3, cada etiqueta OEKO-TEX possui um código que poderá ser introduzido no website para descobrir todas as especificidades relativas ao produto certificado. Como tal, ter um produto com etiqueta Standard 100 by OEKO-TEX é uma garantia de que o tecido não terá quaisquer tipo de químicos prejudiciais ao ser humano.
Figura 3. Etiqueta certificação Standard 100 [Fonte: OEKO-TEX, 2022]
B CORPORATION
Não sendo exclusiva do setor da Moda, a certificação B Corporation, mais conhecida como B Corp, é dedicada a empresas que se distinguem por cumprirem as melhores práticas em áreas como governance, colaboradores, ambiente, comunidade e clientes, isto é, que não se limitam a minimizar os seus impactes e escolhem fazer melhor, nomeadamente na performance ambiental, transparência, responsabilidade legal, sustentabilidade social, etc.
Entre a certificação de produtos e serviços, esta entidade já se encontra presente em mais de 74 países e em cerca de 5 000 empresas, tendo também Portugal a sua ramificação.
Existem várias formas através das quais a moda pode, verdadeiramente, ser mais sustentável, sendo sempre importante ter em consideração os aspetos sociais e ambientais. Para a indústria de vestuário se tornar cada vez mais sustentável, cada parte da cadeia de valor deve evoluir – o que logicamente nos inclui a nós, os consumidores. Qual o papel dos consumidores? Quais os pequenos gestos do dia-a-dia que podem ser realizados?
Fontes:
B Corporation (2022), URL: https://bcorporation.eu/, consultado em maio de 2022.
Better Cotton Initiative [BCI] (2022), URL: https://bettercotton.org/, consultado em maio de 2022.
Ecocert (2022), URL: https://www.ecocert.com/pt-PT/home, consultado em maio de 2022.
Fair Trade Certified (2022). URL: https://www.fairtradecertified.org/, consultado em maio de 2022.
Global Organic Textile Standard [GOTS] (2022). URL: https://global-standard.org/, consultado em maio de 2022.
OEKO-TEX (2022), STANDARD 100 by OEKO-TEX®, URL: https://www.oeko-tex.com/en/our-standards/standard-100-by-oeko-tex, consultado em maio de 2022.
Silva, M. (2021). Guia para as certificações de Moda sustentável, URL: https://www.vogue.pt/guia-para-as-certificacoes-de-moda-sustentavel, consultado em maio de 2022.